Brasília – A Lei de Licitações para realizar a contratação de obras de infraestrutura pode estar com os dias contatos.
A pá de cal sobre a Lei 8.666, em vigor há 22 anos, foi lançada na semana passada, com a aprovação pelo Senado de uma Medida Provisória que estendeu aos projetos de infraestrutura o Regime Diferenciado de Contratação (RDC).
O texto, que agora aguarda sanção da presidente Dilma Rousseff, libera a utilização desse modelo simplificado de licitação para contratar qualquer tipo de obra logística.
Dilma sempre apoiou o RDC e há anos defende a sua adoção para todas as obras públicas, principalmente na área de infraestrutura.
A Medida Provisória 678, encaminhada por Dilma em junho ao Congresso, previa a aplicação do RDC em obras no âmbito da segurança pública, mas o texto foi ampliado na Câmara dos Deputados, com apoio do governo, e aprovado no Senado com as alterações. A expectativa, portanto, é que Dilma sancione a proposta.
A contratação de obras pelo RDC pode ser feita em várias modalidades, mas a que tem sido mais usual – e que provoca mais polêmica – é a contratação global, na qual o vencedor de determinada obra fica responsável por executar desde os projetos básicos de engenharia do empreendimento até a especificação de seus materiais e a execução final da obra.
Ou seja, no RDC, as obras passam a ser contratadas sem o projeto básico de engenheira, etapa exigida em certames regidos pela Lei de Licitações, pela qual cabe ao governo contratar os estudos de engenharia no mercado, para depois licitar a execução da obra, conforme as necessidades técnicas apontadas nesses projetos iniciais.
Gestão
A nova forma de contratação está longe de ser unanimidade. “Na realidade, o RDC vai contra toda a lógica de transparência que se busca na gestão pública.
Vamos passar a contratar obras complexas e caras, baseadas em preços fechados e sem estudos independentes”, diz Carlos Mingione, diretor do Sindicato da Arquitetura e da Engenharia Consultivas (Sinaenco).
Para o vice-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), Anderson Fioreti de Menezes, o modelo faz com que o governo se exima da responsabilidade de analisar o que será contratado.
“O poder público abre mão de seu dever de definir o que vai contratar e deixa essa função para a empresa, importando-se basicamente com o preço que vai pagar.”
Para críticos do RDC, o governo baixa a guarda e abre espaço para que as empreiteiras dominem o processo de contratação, em um momento em que deveria mostrar justamente o contrário, por conta da revelações da Operação Lava Jato.
“Um projeto bem feito é uma vacina para a corrupção. O que estamos prestes a ver é a abertura total para se fazer qualquer coisa”, diz Mingione, do Sinaenco.
Criado em outubro de 2011, o RDC tinha o propósito de acelerar a contratação de obras da Copa do Mundo e da Olimpíada de 2016. O que se viu em relação à Copa, de fato, é que diversos projetos atrasaram e muitos nem foram entregues até hoje.
Em 2012, o modelo passou a ser fortemente usado em obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
O governo afirma que experiências em contratações de obras feitas pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e pela Infraero garantiram a contratação de uma obra mais barata, já que o RDC permite ainda que seja realizada uma etapa de leilão entre seus participantes.
O governo justifica ainda que a concorrência pública se dá em menor tempo, porque etapas da tradicional Lei de Licitações são eliminadas.
Ao contrário do que ocorre com a 8.666, o RDC só exige avaliação de documentação da empresa que for declarada vencedora da concorrência, em vez de checar antecipadamente a situação de todos os interessados no certame, como ocorre no processo tradicional.
Aditivos
Em 2011, quando escândalos de corrupção envolvendo o Dnit e a Valec vieram à tona, a então ministra do Planejamento, Miriam Belchior, chegou a afirmar que o governo passaria a exigir a realização prévia de projetos executivos – e não apenas básicos – para contratação de obras.
Ou seja, haveria maior rigor no detalhamento técnico, para evitar a festa de aditivos que tomava conta dos contratos. Não aconteceu.
“O que vemos hoje é exatamente o oposto. Estamos diante de um modelo que, na realidade, dificulta o trabalho de fiscalização”, diz Anderson Fioreti de Menezes, do CAU/BR.
Fonte: Exame
Por: André Borges, do Estadão Conteúdo