O processo de concessão de ferrovias no Brasil atraiu o interesse de vinte grupos – até companhias novatas no setor entraram na disputa. É o caso, por exemplo, de JSL (logística), Votorantim (de metais), Norsk Hydro (alumínio) e J&F (dona da produtora de proteínas JBS). Apesar disso, em grande parte os estudos das empresas ainda nem começaram e executivos já comentam: vão pedir ao governo adiamento do prazo para entregar os levantamentos.
A autorização do Ministério dos Transportes, concedida em agosto, se refere a seis trechos (veja o mapa). As empresa podem oferecer, em até oito meses, seus levantamentos finais ao Planalto para embasar os editais de licitação. O governo deu essa responsabilidade às companhias depois de os estudos originalmente encomendados por Brasília sofrerem críticas da iniciativa privada por supostamente terem investimentos subestimados.
Ao todo, 71 autorizações foram concedidas e, em cada trecho, há de nove a 14 grupos autorizados. Mas só um levantamento será escolhido pelo governo em cada lote. Os levantamentos devem incluir estudos básicos, de projeto, de impacto ambiental, de orçamento e de cronograma físico dos empreendimentos. Posteriormente, o ganhador da futura concessão terá que remunerar quem fez o estudo do trecho. O custo de cada levantamento, de até R$ 20 milhões, é um limitador. Apesar das várias autorizações, as empresas não são obrigadas a fazer ou entregar os projetos (alguns executivos mencionam que haverá apenas quatro ou cinco estudos por trecho).
De qualquer forma, a lista revela quem está interessado no setor – apesar de ninguém ainda cravar a participação como futuro concessionário.
Fernando Simões, presidente da JSL (antiga Júlio Simões Logística), é um dos que estão envolvidos no processo. Em entrevista ao Valor, ele diz que a empresa não atua em ferrovias atualmente, mas que tem “obrigação” de avaliar as oportunidades no setor. Com faturamento consolidado de R$ 5,2 bilhões em 2013, a companhia pediu para estudar os seis lotes disponíveis (e foi autorizada em todos os casos) e agora vai dar prioridade sobre os que têm mais demanda. “Nós percebemos que, em alguns desses lotes, há clientes atuando na região. Em outros casos, há potenciais clientes. Observamos oportunidades e agora estamos avaliando se vamos estudar e em quais lotes vamos fazer os estudos”, diz o executivo, mencionando eventuais clientes industriais e de agronegócio como potenciais usuários de seus trechos.
Simões lembra que as ferrovias ainda estão em processo de avaliação pela companhia – a JSL pode ou não atuar no setor. Ainda assim, ele não descarta virar um investidor (concessionário) do modal. “A JSL é feita de unidades de negócio em que você faz investimentos desde que haja viabilidade econômico-financeira e que tenha uma demanda garantida. E a ferrovia não deixa de ser um negócio com essa vocação”, afirma. Mesmo assim, e mesmo tendo em conta que a demanda de cada trecho é garantida pelo Estado, Simões diz que – caso vire investidor de ferrovias – vai dar prioridade a trechos que tenham um interesse natural do mercado. “Não tem negócio saudável que se sustente só do governo”, diz.
A Norsk Hydro, de origem norueguesa, também está autorizada a estudar e tem interesse específico na ferrovia entre Açailândia (MA) a Barcarena (PA). No Pará, a companhia hoje extrai bauxita na cidade de Paragominas e depois a encaminha para refino e produção de alumínio primário em Barcarena. Segundo o vice-presidente executivo da Hydro, Alberto Fabrini (responsável pela área de bauxita e alumina), a companhia quer atuar futuramente como usuária da ferrovia.
Ana Paula Paiva/Valor
“Nosso interesse em apoiar este trecho vai ao encontro de nossas necessidades em relação ao minério que é lavrado em Paragominas e transportado até Barcarena, tornando-nos assim uma das principais usuárias da ferrovia, não apenas para o transporte de bauxita, como de outros insumos”, diz Fabrini por e-mail. Segundo o executivo, o trecho também atenderia à nova fábrica em Barcarena da Cia. de Alumina do Pará (CAP), “que está on hold (espera) em razão da atual situação do mercado do alumínio no mundo”. Atualmente, a companhia diz estar em busca de parcerias para contribuir “com um estudo de engenharia de alta qualidade, para tornar viáveis técnica e economicamente a concessão e a operação da ferrovia”.
Outra interessada (no mesmo trecho) é a Votorantim. O grupo se diz “potencial usuário” da Ferrovia Norte-Sul, que atenderá o município de Rondon do Pará (PA). Lá, a empresa possui o projeto Alumina Rondon (empreendimento de refinaria integrada de alumina e mina de bauxita que tem previsão de iniciar operação em 2017). Em fase de licenciamento ambiental, é um dos principais investimentos do grupo no Brasil. “O interesse da empresa se deve às vantagens competitivas que o modal ferroviário dará ao empreendimento e à região sudeste do Estado do Pará”, informou por meio de uma nota. Cada empresa pode tentar influir no traçado dos trechos para atender suas respectivas demandas. Tanto Norsk Hydro como Votorantim se mostram interessadas em ser usuárias, e não concessionárias.
Já a empreiteira Galvão Engenharia está associada à Mendes Júnior e à Promon Engenharia nesta etapa. “Acreditamos que temos as condições de fazer os melhores projetos”, diz Carlos Fernando Namur, vice-presidente de infraestrutura da Galvão. O grupo selecionou dois trechos para estudar, com a justificativa que conhece as regiões: Belo Horizonte (MG) a Guanambi (BA) e Estrela D’Oeste (SP) a Dourados (MS). Este último trecho atrai atenção especial. “É uma ferrovia bastante necessária. Imaginamos que seja uma prioridade [para o país]”, afirma.
Além disso, a Galvão confirma o interesse em disputar os futuros leilões de ferrovias. “Sem dúvida, queremos disputar outros também [além dos já estudados]”, afirma. A licitação mais adiantada é a do trecho Lucas do Rio Verde (MT) a Campinorte (GO), que já tem estudos prontos e não é alvo de novos levantamentos. “Nós estamos acompanhando de perto, porque é um esforço danado de investimento. Dependendo das condições, temos interesse [nessa linha]”, diz. A empresa ainda espera, por exemplo, que o governo adicione mais garantias de pagamento do Estado à companhia investidora.
Dona da maior produtora de proteínas do mundo, a J&F Investimentos também não atua em ferrovias, mas está na lista dos novos interessados. Nesta fase, ela participa em sociedade com Carioca Christiani-Nielsen Engenharia e Concremat Engenharia e Tecnologia. A J&F começ a disputar com mais frequência ativos em infraestrutura. Já está em energia e disputou neste mês (mas não ganhou) a rodovia dos Tamoios (em São Paulo). Conforme apurou o Valor, a empresa tem interesse em ser concessionária de ferrovias.
Também estudam o setor empresas como Triunfo Participações e Investimentos, EDLP, Alusa Engenharia, Queiroz Galvão, Andrade Gutierrez, CR Almeida e Progen. O governo já tem um lote pronto para a concessão, mas ainda não o lançou. Está à espera de interessados. Sem estar credenciada para estudos, a Camargo Corrêa analisa de perto o primeiro leilão.
Fonte: Valor Econômico
Por Fábio Pupo | De São Paulo