Fonte: Valor Econômico
Enquanto o modelo de logística reversa para o país aguarda aval do governo, indústrias que fabricam ou utilizam embalagens se movimentam com estratégias, ações e metas isoladas de reciclagem, em busca de ganhos econômicos e de eficiência em processos produtivos. “No nosso negócio, reciclagem é chave para a competividade”, argumenta Rogério Almeida, vice-presidente de operações da Novelis, única fornecedora de chapas de alumínio para latas de bebida no país.
Independentemente do que será resolvido no acordo dos diferentes setores com o governo, o objetivo da empresa para 2020 é aumentar de 57% para 80% o conteúdo de matéria-prima reciclada nos produtos, reduzindo a dependência de recursos minerais primários.
A empresa produz anualmente em torno de 400 mil toneladas de chapas, com expectativa de crescer 50% a partir da atual expansão de sua unidade industrial localizada em Piracicaba (SP), na qual foram investidos US$ 400 milhões. A ampliação incorporou a necessidade de novas ações para o aumento da matéria-prima reciclada e uso de gás natural. A reciclagem permite uma redução de 95% no consumo de energia, em relação ao uso do alumínio primário.
O país produziu 21,1 bilhões de latas de bebida em 2012, cem unidades por habitante. A capacidade produtiva é de 27 bilhões, segundo dados da Abralatas, associação que agrupa os fabricantes do setor. Do total colocado no mercado, 97,9% são coletadas após o consumo da bebida e de alguma maneira retornam às indústrias – mais da metade reabastece a Novelis.
O índice posiciona o país na liderança mundial da recuperação das latas, à frente do Japão, com um diferencial: a rapidez do ciclo entre produção e retorno, que demora entre 30 e 40 dias. As razões estão, entre outros aspectos, no preço atrativo da sucata, que se comporta com base nas flutuações da commodity no mercado internacional, e na realidade social do país, com a existência de um grande contingente de catadores que dependem da atividade para o sustento de suas famílias.
O ambiente regulatório e as ações das empresas, dentro de programas pontuais de reciclagem, têm o potencial de manter os números nesse patamar confortável, mesmo no cenário de aumento da produção, com maior quantidade de embalagens no mercado. No entanto, a demora na aprovação final do acordo setorial da logística reversa atrasa investimentos e iniciativas mais abrangentes.
Apesar da situação privilegiada em relação às latinhas, o país poderá aumentar a importação de sucata para dar suporte à expansão industrial e às metas empresariais. “É estratégico para cobrir problemas de sazonalidade no fornecimento”, explica Almeida. No período do inverno, quando é menor o consumo de bebidas, há menos sucata disponível no mercado interno. “Para evitar riscos e manter o suprimento contínuo, a empresa buscará novas fontes de matéria-prima reciclada, mais difíceis de processar, como panelas de alumínio”, revela Almeida.
“As metas devem ser ambiciosas, mas de longo prazo”, recomenda Marco Simões, vice-presidente de comunicação e sustentabilidade da Coca-Cola Brasil. Até 2020, a companhia pretende recuperar a totalidade de suas embalagens, evitando o despejo em aterros e lugares inadequados de descarte após o consumo das bebidas.
“A tendência é o insumo pós-consumo não se restringir ao plano das metas e passar a ser business”, diz o executivo. O objetivo inclui a expansão contínua do uso de resina PET reciclada nas embalagens até a conversão de 100% do portfólio. Um desafio é aumentar a escala da transformação da sucata de garrafas PET em novas garrafas, no sistema conhecido como “bottle-to-bottle”, hoje restrito a algumas linhas de produtos da companhia. Planeja-se também o uso de resina plástica de fonte renovável em todos os produtos, nos próximos seis anos.
No caso da Ambev, a tecnologia permitiu dar um salto à frente com o lançamento, em 2012, de garrafas com PET totalmente reciclado – e não contendo apenas um percentual de matéria-prima obtida de garrafas pós-consumo. Devido a essa iniciativa, foram economizadas 8,2 mil toneladas de resina plástica virgem oriunda do petróleo, no ano passado. Até o fim deste ano, a meta é expandir a novidade para todo o portfólio. “A inovação aumentou a demanda por matéria-prima reciclada, agregando valor ao resíduo e beneficiando toda a cadeia da reciclagem”, avalia Simone Veltri, gerente de relações socioambientais. Cada cinco toneladas dessa nova PET libera espaço de 30 metros cúbicos em aterros sanitários, com redução de custos e impacto ambiental.
“Os avanços dependem também de políticas públicas e hábitos do consumidor”, ressalva Fernando von Zuben, diretor de meio ambiente da Tetra Pak, cuja fábrica em Monte Mor (SP) tem capacidade para produzir 8 bilhões de embalagens longa vida por ano. O plano do fabricante é até 2020 aumentar dos atuais 31% para 44% o índice de recuperação de caixas de suco, leite e outros alimentos que coloca no mercado.
A meta brasileira é mais ambiciosa que a adotada globalmente pela companhia, que é de 40%, indicativo da posição do país como um dos pioneiros na formação de cadeias produtivas para a reciclagem dessas embalagens. “O cumprimento dos objetivos ambientais, incluindo o retorno das embalagens à atividade produtiva, pesa no cálculo da bonificação dos funcionários no fim do ano”, diz.